ICMS

Suspenso julgamento sobre ICMS na venda de energia

Pedido de vista da ministra Cármen Lúcia suspendeu, nesta quarta-feira (3/8), a votação pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal da Ação Direta de Inconstitucionalidade, em que se discute decreto do governo de São Paulo que centralizou nas distribuidoras de energia elétrica a cobrança do ICMS devido sobre a comercialização (compra e venda) dessa energia no mercado livre, em vez de cobrá-lo diretamente das comercializadoras. A ADI foi proposta pela Associação Brasileira dos Agentes Comercializadores de Energia Elétrica (Abraceel).

Nesta quarta-feira, a relatora do caso, ministra Ellen Gracie, trouxe seu voto pela declaração de inconstitucionalidade do decreto. Segunda ela, o ato inovou ao estabelecer substituição do responsável pelo recolhimento do ICMS (as distribuidoras, em vez das comercializadoras), sem que ela esteja expressamente prevista em lei. Com isso, ofende o disposto no artigo 5º, inciso II, segundo o qual “ninguém é obrigado a fazer ou a deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.

Além disso, segundo a ministra, o decreto viola o artigo 150, inciso I, que veda à União, aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios “exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça”.

Em seu voto, no entanto, tendo em vista a repercussão da matéria e o fato de que o ICMS sobre tais operações deve ser recolhido, independentemente de quem é a responsabilidade por isso, a ministra Ellen Gracie propôs a modulação da decisão, para que ela somente venha a produzir seus efeitos a partir da publicação do acórdão (decisão colegiada) proferido pela Suprema Corte.

O processo
A Abraceel questiona a constitucionalidade da alínea b do inciso I e dos parágrafos 2º e 3º, todos do artigo 425 do Decreto 45.490 , Regulamento do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte do Estado de São Paulo, com a redação dada pelo Decreto 54.177, de 30 de março de 2009.

A entidade alega que as inovações trazidas pelo decreto violam o preceito constitucional do equilíbrio federativo, uma vez que o governo paulista teria invadido competência privativa da União para legislar sobre energia elétrica. Alega também ofensa aos princípios da legalidade, da capacidade contributiva, da legalidade tributária e da livre concorrência.

Sustenta, ainda, que foi instituído, via decreto, um regime inédito de substituição tributária “lateral”, não previsto em lei, no qual o estado de São Paulo disponibiliza ao agente de distribuição (que não participa da negociação) o preço praticado pelos agentes vendedores de energia no ambiente de contratação livre.

Entende que tal prática é prejudicial à livre concorrência no mercado de compra e venda de energia elétrica, por eliminar a “principal garantia de competitividade em tal ambiente do setor elétrico, qual seja o sigilo dos preços”, bem como “outorga aos agentes que estão entre os de maior porte econômico no setor elétrico uma enorme vantagem competitiva, uma vez que somente esses agentes passam a deter conhecimento sobre os preços praticados por todos os demais”.

O estado de São Paulo, em contrapartida, justificou a adoção da medida com o argumento de que o decreto somente regulamentou o que já está previsto na Lei Complementar 87/96 e na Lei  Estadual 10.619/2000. Segundo ele, havia sonegação de cerca de R$ 250 milhões do ICMS por ano, somente em São Paulo. Além disso, a cobrança por ele instituída não disponibilizaria os preços praticados em cada operação de compra e venda de energia, apenas o preço médio das operações no mercado livre.

Ainda segundo o governo paulista, a sistemática de cobrança por ele adotada teria o condão de facilitar o recolhimento do tributo, visto ser difícil fiscalizar as empresas comercializadoras que vendem energia elétrica no mercado livre, que representa cerca de 30% de toda a energia consumida no estado, envolvendo cerca de 600 grandes consumidores. Ademais, alega, muitas dessas empresas comercializadoras até mesmo se localizam fora do estado de São Paulo, dificultando sua fiscalização.

Já as distribuidoras, segundo argumentação do estado, têm a metragem exata da quantidade de energia comercializada neste ambiente de comercialização livre, pois são elas que a fornecem ao consumidor final. Assim, não haveria o risco de distorção nas informações a serem prestadas à Secretaria de Fazenda Paulista para fins de recolhimento do ICMS.

O advogado da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee) contestou esse argumento. Segundo ele, os contratos de compra de energia elétrica no mercado livre são registrados na Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), e também o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) recebe tais dados. E isso, segundo ele, permite o cruzamento desses contratos com as obrigações tributárias deles decorrentes.

A ADI foi reautuada da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 180. Com informações da Assessoria de Imprensa do Supremo Tribunal Federal.

ADI 4.281

Revista Consultor Jurídico, 4 de agosto de 2011

ICMS

Há duvidas sobre ICMS em energia não consumida

A questão gira em torno da incidência ou não do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) nos contratos de demanda contratada de potência elétrica mínima. Antes, porém, fazem-se necessárias algumas considerações preliminares.

A distribuição de eletricidade é realizada através de redes elétricas instaladas país afora, cuja construção, manutenção e operação ficam a cargo das empresas concessionárias do serviço público de distribuição de energia elétrica.

Tais redes elétricas conduzem eletricidade das fontes geradoras até os grandes centros urbanos, distribuindo potência elétrica suficiente para o abastecimento de todas as unidades residenciais e estabelecimentos de pequeno e médio porte, que pagam apenas pelo que efetivamente consumirem.

Entretanto, quando se trata de consumidores de grande porte, cujo consumo sobejar, em muito, a média local, tais como indústrias, shopping center, hospitais, faculdades etc., geralmente a distribuição de eletricidade nos moldes convencionais não é suficiente para suprir toda a demanda.

Nesses casos é necessária a celebração de um acordo com a companhia elétrica responsável pelo abastecimento na região no sentido de que seja disponibilizada uma potência elétrica mínima para atender a demanda excedente. É justamente o que se convencionou chamar de Contrato de Demanda Contratada de Potência Elétrica Mínima.

Por meio desse tipo de contrato, a companhia elétrica se obriga a fornecer uma quantidade fixa de energia por mês, ao passo que consumidor será submetido ao pagamento da potência total disponibilizada, independentemente se houve consumo ou não.

Feita essas considerações preliminares, passemos à análise do caso.

O ICMS é um imposto de competência estadual que incide, dentre outras hipóteses, nas operações de circulação de mercadoria com fins mercantis.

Considerando-se que energia elétrica é considerada mercadoria, uma vez que se trata de um bem passível de mensuração e valoração, sua comercialização constitui hipótese de incidência do imposto. Não há dúvidas, portanto, de que o consumo de energia elétrica constitui fato gerador do ICMS. A questão reside sobre qual base de cálculo o imposto deveria ser calculado nesse tipo de operação.

No modelo de consumo convencional, em que só se paga pelo o que efetivamente se consome, o ICMS é calculado sobre o valor total da fatura. Sobre isso não há controvérsia.

Entretanto, quando se trata de energia elétrica fornecida mediante contrato de demanda contratada, os Fiscos Estaduais tem arraigado o costume de cobrar imposto sobre o valor total do contrato, independentemente se houve ou não o consumo total da potência elétrica disponibilizada.

Tal prática viola expressa disposição prevista na Lei Complementar 87/96 (Lei Kandir), segundo a qual considera-se ocorrido o fato gerador apenas quando houver a efetiva saída da mercadoria do estabelecimento do contribuinte. Vejamos:

Art. 12. Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:

I – da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular;

Ora, se não houve o consumo de toda a energia elétrica disponibilizada, logo, conclui-se que não houve transferência do remanescente. Não havendo transferência, não há o que se falar em fato gerador do imposto, uma vez que a circulação de mercadoria para fins de incidência do ICMS pressupõe a transferência da titularidade, o que não se observa nos casos em estudo.

Diante dessa realidade, foram muitas as ações intentadas na Justiça para estancar tal exação, estando hoje pacificado no Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que não há incidência de ICMS em relação à potência de energia elétrica não utilizada nos contratos de demanda contratada.

Entretanto, o Poder Judiciário ainda não se manifestou em definitivo sobre a questão. É que o Estado de Santa Catarina interpôs um Recurso Extraordinário contra parte do acórdão que julgou inconstitucional a inclusão dos valores pagos a título de demanda contratada na base de cálculo do ICMS.

Em decisão não unânime, os ministros do Supremo Tribunal Federal reconheceram a repercussão geral da matéria, quedando o recurso pendente de julgamento desde meados de 2009.

Não temos, portanto, uma solução definitiva sobre a questão. O fato é que até o STF se pronunciar sobre o caso, seguirá dúvida sobre a incidência ou não do ICMS em relação à energia elétrica não consumida nos contratos de demanda contratada.